Há duas mães: uma que tem uma família estruturada, com um
marido e uma filha, numa harmoniosa convivência, daquele tipo de convivência de
sentar-se à varanda de casa e jogar conversa fora, cantar alguma canção folclórica
e lembrar situações pitorescas da vida. Na outra via, uma mãe que só tem como
família um filho, e vive com ele uma relação difícil, distante, de
desencontros. Desencontros no espaço coabitado, e desencontro afetivo –
enquanto ela procura ser carinhosa dentro da medida do seu melhor, o menino a
mantem afastada dele. Uma mãe é tranquila, serena, apenas esperando o seu
destino chegar, o que não tarda a acontecer. A outra tem uma vida social/emocional
agitada, de romances efêmeros e noturnos, ao que tudo indica.
Nesse meio, entre as duas mulheres de perfis antagônicos, uma
aldeia que às vezes é invadida por tufões, e com eles a chuva. Mais uma vez o
elemento que denota emoção. Uma aldeia que traz um homem morto ao mar, logo no
primeiro terço de projeção, nos alertando que o filme trata de questões que
permeiam nossas vidas, como a morte.
Uma aldeia onde um velho e sábio (todos os aldeões velhos são
sábios) – uma espécie de conselheiro tribal – corta a garganta de um ou outro
cabrito, passando a navalha sobre o pescoço do animal, e o horror que tal cena
possa nos causar. Mas é por certo a garantia de comida à mesa. Uma metáfora
sobre a questão dialética da vida e da morte.
A figura do velho, pois, é a figura do tempo. O que nos dá o
alimento que consumimos para sustento da alma. Nossas histórias, nossas
vivências, o que levaremos conosco pra onde quer que formos.
“Still The Water” nos fala da vida, da morte, do tempo. E de
como esses personagens lidam com isso. As marés são as mães desta história – haja vista a fala de um dos personagens aos quase 20 minutos finais.
A frase final do ancião fecha de maneira interessante essa
história, trazendo um delicado desfecho a esse bem dirigido filme japonês, não
deixando dúvidas de que é a ele – o tempo – que devemos dar o que de melhor
temos em nós, seja revolta ou serena a nossa natureza. O tempo é quem vai
esperar alguma coisa dos que ainda estão construindo suas histórias. E, sábio,
o tempo, enquanto vê os dois jovens nadando no mar, diz que está “...contando
com vocês, crianças...”
Um filme pra se refletir um pouco sobre a vida dentro do mar
de cada um de nós.
Carmem Cortez