O JOGO DA IMITAÇÃO surpreende por ter sido indicado aos
Oscars de melhor filme, diretor (Morten Tyldum), ator (Benedict Cumberbatch),
atriz coadjuvante (Keira Knightley), roteiro adaptado (Graham Moore), trilha
sonora (Alexandre Desplat), montagem e direção de arte, quando o mais
surpreendente no filme é a história (real) do matemático Alan Turing.
Como é possível que esse gênio, que deu o pontapé inicial na
criação das máquinas pensantes - nossos tão íntimos computadores -, seja
desconhecido do grande público até este filme? E como ele pôde ter sido
condenado por ser homossexual em pleno século XX?
No filme há uma frase linda dita mais de uma vez: "Às
vezes são as pessoas que ninguém imagina os que fazem as coisas que ninguém
imaginou”. Muitas pessoas que contribuíram
para o desenvolvimento da ciência e tecnologia caíram no esquecimento e outros
que pouco fizeram são injustamente incensados como deuses. Este filme tem o mérito
de resgatar e fazer uma homenagem a Alan Turing.
Mas, além disso, é diversão também! O diretor norueguês, em
sua estreia num filme britânico de alto orçamento, consegue imprimir um ritmo
animado, embalado por boa música, mesclando trechos de documentários da segunda
guerra com o drama da vida pessoal de Alan, desde a adolescência até o fim
prematuro de sua vida aos 41 anos. Entendemos o quanto ele gostava de
criptografias, jogos, matemática, enfim, do pensamento lógico, e o descompasso
de sua vida emocional, sua dificuldade de seguir padrões sociais, de ser aceito
como era.
A questão da homossexualidade permeia todo o filme, mas fica
em segundo plano, embora tenha o impacto de uma daquelas bombas que caíam sobre
Londres na II Grande Guerra Mundial. E ao sabermos que mesmo a ilibada OMS só
retirou a homossexualidade da lista internacional de doenças em 1990 (em vigor
só em 1992), fica compreensível, mesmo que inaceitável, que na civilizada
Grã-Bretanha até os anos 60 tenha existido punição para os gays. Mais um paradoxo
da Humanidade.
Churchill foi decisivo para a continuidade do projeto de
Alan e aparece rapidamente em imagens antigas. Os russos também, apesar de decisivos
na vitória aliada, tem uma menção dentro da lógica da época.
O pensamento, o que é ser humano, o que é uma
máquina-que-pensa, os preconceitos, os sentimentos, a sobrevivência, o que
importa na vida afinal, são mostrados de forma cativante numa história que
poderia continuar desconhecida por muito tempo. E - seria ironia? - ao redor de
uma primitiva fogueira o filme nos revela a imagem mais descontraída de Alan
Turing. Afinal o domínio do fogo e a descoberta dos meios para produzi-lo foi
um passo tão grande para a humanidade quanto a fabricação de uma
máquina-que-pensa. Para o bem ou para o mal.
Cristina Paraguassu