Alguém já disse que os russos não são muito bons em comédias, são dramáticos e sentimentais por natureza, realizaram assim algumas obras primas da humanidade. Mas Shapito-shou, ou Chapiteau-Show, de 2011, dirigido e editado por Sergei Loban, extrapola o risível.
Uma espiral surge na tela nas quatro histórias: Amor, Amizade, Respeito e Cooperação. E todas as histórias se
entrelaçam, pois todos vão para uma pequena cidade na Crimeia, no Mar Negro,
onde no alto de um penhasco há um circo bizarro. Neste circo todos cantam e/ou
dançam e há ironias com fatos que vão desde a conquista do espaço, passando por
Marilyn Monroe e Michael Jackson. E em cada uma das partes, no brilhante
roteiro de Marina Potapova, cada personagem lida com problemas existenciais
profundos, contemporâneos como a amizade virtual (o Estranho Cibernético), ou o
eterno conflito de gerações entre pai e filho, a questão dos deficientes e a
inserção na sociedade (o Surdo), e a própria arte e criatividade na hilária definição
de um cover que não seria, mas de fato é uma imitação péssima de um grande
cantor do passado.
O Circo é, além do local de
convergência das personagens, uma dose extra de gargalhadas. A extensa duração
de 207 minutos não é sentida, exceto por dores no maxilar por causa do excesso
de riso.
Uma direção de arte bem cuidada,
com o contraste de lugares opressores (um apartamento bagunçado, uma escola
severa, um teatro, uma loja) e depois a beleza do Mar Negro, praia de pedras,
sol, pessoas felizes e vida ao ar-livre. Até os mínimos detalhes como uma
camiseta com o Mickey Mouse, um macaco, um toureiro...
Um orçamento de cerca de U$2
milhões, segundo Marina, conseguidos com um dos novos ricos da Rússia, de uma
forma tão esquisita quanto o filme, o fato de usarem atores amadores ou pessoas
comuns, e ser um filme autoral, contribuem para ser tão diferente do cinema russo
das escolas que também produzem belíssimas obras, mas sem este humor
escrachado.
E por ser tão hilário, Shapito-shou nos lembra
de nossa condição humana de sermos o único animal que ri. Inclusive os russos!
Cristina Paraguassu