CORES DO DESTINO ( 2013 / USA / 96’/ Upstream Color ) - por Pedro de Alencar.




Em 2004, Shane Carruth lançava PRIMER, um filme sobre viagem no tempo com um orçamento surpreendente de sete mil dólares. Para alguns, pretensioso, para outros, genial. PRIMER tem direção pouco inspirada e montagem irregular ao lado de um roteiro muito bem escrito e pesquisado, sem buraco algum. O fato é que o filme surpreendeu a muitos e criou uma legião de fãs e curiosos que aguardavam por seu próximo filme, que só chegou nove anos depois.


CORES DO DESTINO é certamente menos complexo que PRIMER, mas isso não é ruim. Muito pelo contrário: aqui o roteiro não sobrepõe o que vemos em tela, porque não é esse mais o objetivo. O roteiro de UPSTREAM COLOR valoriza mais a percepção e a experimentação do que o desvendamento de um mistério ou método, a começar pela premissa. 


Um ladrão busca larvas em um determinado tipo de planta numa floricultura. Essas, quando ingeridas, tem como efeito a total submissão de quem as ingere. Acompanhamos Kris, vítima de um ladrão que utilizou essa droga para roubar todo seu dinheiro. Kris eventualmente se livra da larva, e essa é transferida para um porco, que passa aos cuidados de um fazendeiro. Dias (ou seriam semanas, meses?) depois, Kris encontra Jeff e vive um relacionamento com ele, para aos poucos descobrir a real natureza do que os dois estão sentindo.


A direção remete a Terrence Malick, mas tem uma ânsia por decompor as ações constantemente, mesmo enquanto a câmera caminha lentamente. Isso poderia não funcionar se a montagem não fosse tão precisa. O ritmo, muito regular, mesmo rápido permite a reflexão nas cenas, não nos apresentando aos fatos com pressa. Há tempo para sentir o que está sendo dito, em parte pela trilha sonora impecável e fundamental também para a narrativa. Tão fundamental que em determinado momento o filme nos faz questionar se é diegética ou não – e ainda não sei a resposta pra isso. A trilha dialoga com o design sonoro maravilhosamente. Esse último é sem dúvidas o maior mérito técnico do filme, se tornando também elemento narrativo essencial para a experiência sensorial proposta pelo realizador. Tudo flui e de certa forma entra no filme, possibilitando uma imersão que nos ajuda a captar a mensagem de Carruth e formular nossas próprias perguntas e respostas.


Apesar de não parecer simples, o roteiro é fechado narrativamente, mas aberto à nossa interpretação acerca das intenções de Carruth. Por que sentimos o que sentimos? Temos total livre-arbítrio ou somos guiados pelo destino? Para mim, essas são as perguntas, mas outras podem surgir para demais espectadores. O filme deixa uma inquietação que pode durar dias (ou semanas, meses), e esse é o real objetivo do segundo longa do diretor. Shane Carruth pela segunda vez nos faz pensar, só que dessa vez pra muito além do filme.

Pedro de Alencar