É comovente ouvir, ver e sentir o mar pelo personagem do
Irandhir Santos, nesta obra chamada A Historia da Eternidade. É comovente ver o trabalho de corpo que este ator tem, ao se
entortar, rodopiar... Deixar-se carregar por sua poesia, por sua arte, pois
artista ele é na história do filme e na própria vida... Deixar-se carregar pela personagem de sua
sobrinha depois que tomba ao chão...
Há nesses atores uma sincronia de corpo e alma. Um elenco que
se entrega ao diretor, e se deixa conduzir por suas mãos. O resultado é
harmônico. Na medida. Como uma cantiga bem ritmada. E gostosa de ouvir.
Há momentos em que se percebe uma marcação dos atores típica
de montagem teatral. Essa, digamos assim, intervenção do teatro na cena
cinematográfica, reforça a ideia de que temos um conto narrado pelos olhos de
um artista. E nos aproxima mesmo do artista que o Irandhir interpreta.
E ele é um louco. É assim que é visto pelo irmão. Mas somente os loucos transcendem a razão, a
racionalidade, a irracionalidade do racional que só pensa com a equacionalidade
do 2+2, e mantem a alma refém da aridez, da mente infértil e infeliz.
Além da marcação, o filme traz uma curiosa e bem sacada
câmera que enfatiza, com seus enquadramentos, mais o chão, a terra, dando
pistas de que há ali sentimentos muito bem sedimentados. Guardados. Recalcados
até. E então vem a chuva. E enquanto ela desce, tudo acontece. Como se fosse
uma explosão – de sentimentos, dos desejos reprimidos. O que de bom e ruim
acontece neste momento até o ápice desta cena, é o ponto alto. Uma das várias
bolas dentro desta Historia da Eternidade.
E a câmera segue, ora aproximando, ora afastando, como se
fosse um bailado. Nem muito, nem pouco, mas o suficiente para darmos conta de
que esse bailado é uma espécie de ensaio, de erro e acerto, que os personagens
fazem com suas emoções, ora deixando aflorar qualquer coisa que grita por
dentro, ora afastando uma sensação qualquer que vem com a força da chuva que
cai e encharca aquele chão sertanejo.
A menina – “essa menina” – como se chama alguém comumente no
interior do nordeste, só quer um presente no dia do seu aniversário: ver o mar.
E não tem presente melhor do que escutar o mar dentro de si por intermédio de
Joãozinho, seu tio (Irandhir Santos), que assim como os poetas, sabe pela força
das palavras e da imaginação, fazer sonhar o sonho de se sonhar acordado.
Carmem Cortez